Maturidade da vida digital
Por Filipe Crespo*
Esse mundo digital ainda meio diferente.
Aliás, gente competente como Manuel Castells e Pierre Levy já tratam do tema faz tempo, porém vamos aqui dar o nosso pitaco.
Mas pra gente discutir sobre isso, teremos que sair um pouco dessa bolha Itaim/Pinheiros/Vila Olímpia nossa de cada dia.
Quando falamos de consumo digital nesse nosso Brasilzão afora, pode ter certeza que tem de tudo. Veja só.
Tem aquele cara que antes nem acessava a internet e que recentemente passou a usar.
Tem também aquele que já acessava a rede, mas agora “pulou” do PC para o notebook. Muito mais fácil, aliás. Dá pra ficar no Facebook do sofá de casa. Coisa linda.
Tem aquele que deixou o notebook desligado na escrivaninha e agora está plugado na internet via smartphone, deitadão na cama, conversando com geral.
Também tem o que já acessava bastante a internet, mas nada comprava, porque não tinha cartão de crédito ou tinha mesmo medo de colocar ali seus dados bancários. Agora ele compra. Tá felizao. As coisas chegam em casa. Interfone toca. Uma delícia.
E tem aquele que já fazia tudo isso e que agora é heavy user de serviços de entrega como Rappi e iFood. Fica maluco quando chega o cartão de crédito e vê o quanto gastou com comida.
Talvez você já tenha passado por todas essas etapas, mas acredite: 1) tem gente subindo cada degrau do mundo digital dia após dia; 2) tem mais etapa pra você conquistar.
Ainda que tenhamos um Brasil que não acessa a internet (algo em torno de 32% segundo as pesquisas), temos um outro Brasil que vem experimentando etapa por etapa dentro desse mundo. Uma de cada vez. Devagar. É o que eu chamo de maturidade da vida digital.
Já reparou na porta do seu prédio num Domingo à tarde, a quantidade de entregadores de comida? Já reparou a quantidade de gente a sua volta que não saberia viver sem o celular? Aliás, o seu não deve estar muito longe de você nesse momento. Tem bateria? Wi-Fi tá ligado? Tem alguém pra você responder no WhatsApp?
O mundo digital é meu ´Senhor´ e com Ele, nada nos faltará.
E sororidade? Será mesmo que alguém foi procurar o significado no Aurélio? Se foi, deve estar com uma rinite danada. Já no Google, te digo que as buscas pelo termo tiveram 250% de aumento, depois que Manu Gavassi mencionou a palavra no Big Brother Brasil, em rede nacional.
Agora a reflexão: será que agências e marcas buscam entender em que etapa da maturidade digital está seu público?
Mais do que isso, será que agências e marcas ao identificarem a maturidade digital do seu público, estão construindo narrativas específicas para cada degrau desse mundo digital?
Antes de analisar a quantidade de cliques no anúncio ou o tráfego no site da marca, será que não vale pensar se a mensagem de marca é relevante para quem está do outro lado?
Será que a campanha que estamos subindo para nossa marca e que estou objetivando um número grandioso de downloads do app, está chegando para um público que tem essa necessidade e essa maturidade digital?
Um amigo me confessou recentemente que trem sido impactado constantemente por anúncios de empresas que comercializam o Carnaval de Salvador, ofertando abadás em até 12x sem juros, mas que ele acha estranho, pois não curte a data, nunca foi pra Salvador e nem cartão de crédito possui, ou seja: ele nunca nem comprou nada no ambiente digital. Tem algo errado aí, não?
Ei, marca: começa mostrando pro meu amigo que Salvador é legal. Diz que tem o Farol da Barra, o Elevador Lacerda e que tem o maravilhoso restaurante Paraíso Tropical, do chef Beto Pimentel (isso não é um post pago).
Clusteriza esse meu amigo com um monte de gente igual a ele. Põe tudo num pote. Mistura. Guarda na geladeira tampado, pra não estragar. Por etiqueta: “Target em construção para futura conversão”. Com o tempo, pode ser que ele mesmo vá procurar teu abadá. Ou não!
As marcas não podem pensar que da noite pro dia, seus consumidores têm a maturidade digital que elas acham que eles têm.
É difícil vender uma viagem de avião pra Lisboa para quem nunca comprou um livro do Camões na Saraiva.com (mandei logo um Saraiva só porque não tem mais e aí não é #ad)
Ninguém passa do Pentium 386 para heavy user de e-commerce do nada. Tem muito brasileiro ainda nas primeiras etapas dessa régua de maturidade da vida digital.
E penso que a marca, mais do que aproveitar dessa régua digital imaginária que ela acha que já “surfou” seu target, deveria ajudar a construí-la.
Construir um target que te considera hoje e que te compra amanhã pode fazer algum sentido. E esse amanhã, pode ser amanhã mesmo, literalmente. É bem melhor, aliás, isso acontecer, do que ele tentar te comprar hoje no ambiente digital, não conseguir e ter tido uma experiência ruim bem na tua vez, marca.
Anuncia algo que dá pra pagar com cartão pra quem tem cartão; Anuncia formas alternativas de pagar no ambiente digital pra quem já usa as convencionais; Anuncia plano de milhagem de cia. aérea, pra quem já andou de avião, vai.
Pensa nisso.
*Filipe Crespo é publicitário formado pela UniSantos e Mestre em Administração com ênfase em Finanças pela Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado. Profissional de mídia certificado pelo Grupo de Mídia de São Paulo construiu carreira em agências como Ogilvy, Africa, Y&R, JWT, W/McCann e MullenLowe, atendendo clientes como: P&G, Unilever, BRFoods, LG, Bradesco e Mastercard. Atualmente é Sócio Diretor do Creativosbr e Consultor de Mídia do McDonalds no Brasil. É idealizador do Amigos do Mercado. É também professor de Planejamento de Mídia na FECAP, na FAAP e na Pós-Graduação do Mackenzie.
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