Voz
Por Adão Casares, publicitário, pai da Nathália e do Bruno.
Quando eu soltar a minha voz
Por favor entenda
Que palavra por palavra
Música de Gonzaguinha, interpretada também e brilhantemente por Maria Bethânia, e eu acho que se a Bethânia cantou é improvável que você encontre uma interpretação melhor!
Sim, a voz, que mexe com os nervos ou dá sono, narra o futebol transmitido pelo rádio com emoção e pela televisão na maioria das vezes é um marasmo. A fala é a primeira ferramenta de comunicação que o ser humano descobre. Aprendemos a falar antes de conversar, dançar, gesticular. E essa fala tem sotaque.
Li uma matéria interessante no G1 por esses dias a respeito da fala, segue aqui um trecho para que eu consiga prosseguir com a minha explanação sobre vozes, falas, sotaques e sei lá o que mais irei dizer até o final desse artigo:
“Pernilongo ou muriçoca? Pão francês ou cacetinho? Bombom ou queimado? Os estados brasileiros têm o seu próprio vocabulário […]
Muitos locais do país têm um jeito diferente de pronunciar a letra “R”. Tem o “R” retroflexo, popularmente conhecido como “R” caipira; o “R” carioca, que raspa no fundo da garganta […]
O maior número de pessoas falando o “S” chiado está no Rio de Janeiro. De cada 100 cariocas, 97 chiam, principalmente quando o “S” está no meio da palavra […]
O jeito mineiro de encurtar as palavras e como em São Paulo o “R” se multiplica. O pronome “tu”, a campeã é Porto Alegre, onde de cada 10 pessoas, seis se referem ao outro como “tu”.
(http://g1.globo.com/jornal-hoje/noticia/2014/08/sotaques-do-brasil-desvenda-diferentes-formas-de-falar-do-brasileiro.html / Ana Zimmerman)
Entendo que quando se aprende uma língua é através da escuta de sons e imitando seus pais. Depois, imagino que o seu cérebro começa a fazer outras coisas, assumindo que já tinha aprendido. Bem, a meu ver, atualmente estamos construindo uma Torre de Babel inversa.
Neste duro 2020 que vivemos, de acordo com um post no Instagram da Martha Gabriel (@marthagabriel) no dia 15 de junho, no ambiente digital, 50% de todas as buscas são por voz. Duas em cada cinco pessoas dizem que os dispositivos ativados por voz são essenciais em suas vidas. O uso diário de busca por voz é utilizado por 55% dos adolescentes, 44% pelos adultos e 18% das pessoas usam a Siri pelo menos uma vez ao dia. Até o Twitter entrou na onda, agora conta com tuítes de áudio, podem ser gravações de até 140 segundos por publicação. No meu dia-a-dia eu vejo que as mensagens de áudio no WhatsApp são preferência nacional, enviar áudios virou a forma de se comunicar, a compreensão fica mais fácil.
Em paralelo, o mundo dos “apps de assistentes pessoais” é gigante, conversamos com: Siri, Cortana, Alexa, Lu, Joice, Aura, Bia, Joice, Helô. Amigas que estão lendo, vocês já se perguntaram o porquê de todas as assistentes digitais terem vozes femininas? Pesquisem, mas acho que vocês não vão gostar.
Elon Musk acredita que a inteligência artificial, caso não passe por um processo de regulamentação, se tornará uma ameaça para os humanos. O físico Stephen Hawking também pregava um posicionamento semelhante: para ele, as pessoas correm sérios riscos de terem suas inteligências superadas pelas máquinas (“I’ll be back”, já disse algum personagem popular uma vez).
O filme Her, lançado em 2013, ganhou o público e críticos de cinema ao contar a história de amor entre Theodore, homem solitário, e Samantha, a assistente virtual de seu novo computador, recomendo muito. Sinto que a cada dia os assistentes virtuais avançam, os sistemas cada vez mais inteligentes, presentes em todos os cômodos, viagens e transportes públicos, os computadores vão reconhecendo padrões. Não vai demorar para um assistente de voz fazer uma reunião matinal com o executivo de uma empresa, enviar um relatório por e-mail, pedir o almoço e por aí vai.
Voltando ao sotaque, as crianças da geração Alpha, de até 9 anos, já nasceram em um mundo conectado e interagem naturalmente com assistentes de voz, como Siri e Cortana, têm uma incrível facilidade de relacionar-se. A popularização das interfaces representa uma oportunidade para a gurizada, que ainda não são leitores fluentes, pesquisarem de forma independente na internet. Escolas já utilizam Alexa para enriquecer currículo na educação infantil. Noto que hoje é comum os pais entregarem a educação dos filhos para professores e gadgets, estes últimos com assistentes de voz, que realizam algo que os adultos não fazem sempre: escutar.
A turminha do “OK Google” está aprendendo a falar com as assistentes virtuais, então, será que teremos uma padronização na linguagem, todos falarão de uma única forma? Tenha em mente que se o seu melhor amigo era imaginário, o do seu filho pode ser uma assistente de voz. E todos os assistentes de voz têm a mesma (adivinha?) voz.
Na minha opinião, o sotaque fará falta. Nascido na magnânima Capivari, cidade do interior de São Paulo, ainda escuto, quando vou visitar a família, o “caiperês”, aquele “R” forçado: porta, portão, porteira, vorta urso, vorta bode, forfé, reiva, lasqueira, vortei, barda, rodiá, braba, fórga. Vocês não imaginam como é o diálogo na cancha de bocha.
Fechando de vez este artigo sobre vozes e sotaques, é o meu jeito de homenagear meu grande amigo Francisco “Chico” Cathoud, que nos deixou e agora deve estar falando seu minerês impecável lá no céu.
Vai fazer farta, Chico.
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